Planta da Farmacopeia Brasileira |
Origem, distribuição
A cancorosa é originária da Região Sul da América do Sul. No Brasil é comum nas matas dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e sul do Mato Grosso. Fora de nosso país é encontrada no nordeste da Argentina, norte do Uruguai, Paraguai e na Bolívia.
Descrição
Árvore de pequeno porte (atinge 5m de altura), ereta, multicaule, forma touceiras densas com perfilhos oriundos das raízes. As raízes são fortes e numerosas, avermelhadas externamente e amarelas no seu interior.
O caule é verde-acinzentado, lenhoso, ereto, ramificado, com muitos ramos inermes. Os ramos novos são verde-brilhantes, angulosos, com quatro ou mais quilhas.
As folhas são simples, alternas, coriáceas, lanceoladas, oblongas ou elípticas; a base é aguda, às vezes obtusa, peninérvea; as margens têm de 3 a 9 pares de dentes espinhosos e ápice agudo. O pecíolo é curto e as lâminas são glabras, verde-escuras e brilhantes superiormente e verde-claro-foscas na face inferior.
As flores são muito pequenas, sésseis ou com pedicelo muito curto, actinomorfas, diclamídeas, pentâmeras; o cálice é persistente, com cinco sépalas arredondadas, ciliadas, avermelhadas e unidas na base. A corola tem cinco pétalas livres, ovaladas, amarelo-esverdeadas. Os estames são cinco, alternos com as pétalas, e com filetes achatados.
O ovário é súpero, ovóide, rodeado pelo disco, bicarpelar e bilocular, com um ou dois óvulos por lóculo. O estilete é único, com dois estigmas lobulados. A inflorescência se dá em fascículos axilares de três a vinte flores, e o florescimento ocorre de junho a agosto.
O fruto é escuro quando maduro. As sementes são elipsóides, avermelhadas, em número de uma ou duas por fruto, cobertas por um arilo branco pouco espesso e sucoso.
Uso popular e medicinal
Internamente é usada como antiasmática, contraceptiva, em tumores estomacais e contra ressaca alcoólica. Externamente, como antisséptico em feridas e úlceras.
As mulheres paraguaias a utilizam como antifertilizante. Existem relatos de que suas folhas agem como recuperador do fígado nas enfermidades causadas pelo alcoolismo. Em antigos engenhos de Santa Maria (RS) folhas de erva-mate eram moídas e acrescidas de 10 a 15% de M. ilicifolia, sendo a mistura muito apreciada e procurada para combater azia e gastralgia.
Vários autores relatam que M. ilicifolia é usada como antisséptico, tônico, analgésico, cicatrizante, diurético e contra úlceras gástricas.
Na composição química foram constatadas a presença de vários grupos fitoquímicos destacando-se os terpenos (maitenina, tringenona, isotenginona II, congorosinas A e B, ácido maitenóico), triterpenos (friedelanol, friedelina), óleos essenciais (friedenelol), taninos (principalmente os gálicos epicatequina, epigalocatequina, galato de epigalocatequina), glicolipídeos (mono, di, tri, tetragalactosildiacilglicerol, sulfoquinovosildiacilglicerol) e alcaloides (maiteina, maitanprina, maitensina) [13].
No Brasil é conhecida como "espinheira-santa" em alusão às suas folhas que possuem bordas espinhosas e propriedades medicinais. |
Técnicas de cultivo
Propagação. Podem ser usados os métodos de campo e de laboratório. No primeiro tem-se o processo gâmico por meio das sementes, e os agâmicos, tais como por rebentos nascidos da raiz (divisão de touceira) e por estacas. O método laboratorial in vitro é a multiplicação por meristema, usando tecidos da base do pecíolo, de brotos novos e de gemas.
Espaçamento. Como é planta de sub-bosque, deve ser plantada entre espécies pioneiras sombreadoras, de preferência leguminosas como a pata-de-vaca, maricá, leucena, guandu, etc., em espaçamento 4 x 4 m. Nas entrelinhas destas sombreadoras são plantadas as cancorosas, que ficarão separadas entre si e das sombreadoras por 2 m.
Clima. Subtropical, sendo encontrado em todo o Rio Grande do Sul, especialmente na Depressão Central e no Planalto. Como a cancorosa é planta de sub-bosque e de locais úmidos, quando plantada em plena luz, seu desenvolvimento é lento e sua folhagem torna-se amarelada. Locais iluminados induzem a floração e frutificação abundantes. Na seca, paralisa o seu crescimento, ficando porém latente.
Solos. Prefere os solos férteis, humosos e úmidos. Suporta alagamento temporário, mas não é planta de banhado. Vegeta melhor nos solos de aluvião à beira dos cursos d´água. Nos locais altos só vegeta junto às nascentes de água.
Tratos culturais. Capinas ao redor da planta, adubações orgânicas e controle do excesso de sombreamento são os principais.
Pragas e doenças. Quando cultivada em local com excesso de sombra, pode ocorrer o aparecimento de manchas prateadas nas folhas que sugerem a ocorrência de um problema fúngico. Não se verificou até o momento nenhuma praga nesta cultura.
Colheita. Os princípios ativos estão concentrados principalmente nas raízes, ocorrendo em menor escala nas folhas (que são o objeto das colheitas). As folhas devem ser colhidas no 2º ou 3º ano de vida, devido ao seu crescimento muito lento, mesmo em condições ideais. Não deve ser retirada toda a folhagem, basta de 50 a 60% da copa da árvore. A colheita de folhas é feita no fim do verão e a de raízes no inverno. O rendimento é variável dependendo da idade, das condições climáticas e de cultivo.
Cuidados pós-colheita
- Pré-seleção: consta de uma seleção a campo ou no galpão, visando a eliminar folhas e raízes danificadas e de mau aspecto.
- Limpeza: é feita uma limpeza das folhas e/ou raízes para retirar terra e impurezas.
- Secagem: pode ser feita uma pré-secagem à sombra, em local ventilado, e uma secagem complementar, em estufa. Não é necessária uma vigilância - como no caso das aromáticas, que não devem ser secas a mais de 38°C (35-38°C), mas a temperatura não deve passar de 50°C.
- Embalagem: nunca deve ser feita em vasilhas plásticas. De preferência usar caixas de papelão, sacos novos de algodão ou juta, de papel grosso, e mesmo caixas de madeira desde que não-resinosas.
- Armazenagem: deve ser feita em local seco, com baixa umidade relativa do ar, livre de poeira, fungos, roedores e insetos. Todas as embalagens deverão estar etiquetadas com os nomes (popular e científico), data da colheita, lote e peso líquido.
Colaboração
- Rosa Lúcia Dutra Ramos, Bióloga, FEPAGRO (Porto Alegre, RS).
Referências
- CASTRO, L. O.; RAMOS, R. L. D. Descrição botânica e cultivo de M. ilicifolia. Porto Alegre: FEPAGRO, 2002. 12p. (Circular Técnica, 19).
- AHMED, M. S. et. al. High-performance liquid chromatographic separation and quantitation of meytansinoids in Maytenus ilicifolia. Journal of Chromatography, Amsterdan, v. 213, n. 2, p. 340-344, 1981.
- BERNARDI, H. H. et. al. Algumas pesquisas sobre a "espinheira-santa" ou "cancorosa" Maytenus ilicifolia M., usada como remédio popular no Rio Grande do Sul. Santa Maria: Faculdade de Farmácia e Medicina, 1959. 46 f. (Trabalho realizado no Centro de Pesquisas Bioquímicas das Faculdades de farmácia e de Medicina de Santa Maria).
- CARLINI, E. L. A. Estudo de ação antiúlcera gástrica de plantas brasileiras: Maytenus ilicifolia (espinheira santa) e outras. Brasília: CEME/AFIP, 1988. 87 p.
- COIMBRA, R. Notas de fitoterapia. Rio de janeiro, 1958.
- GONZALES, M. ; LOMBARDO, A. ; VALLARINO, A. Plantas de la medicina vulgar del Uruguay. Montevideo: Talleres Graficos, 1937. 150 p.
- JOLY, A. B. Botânica: introdução à taxonomia vegetal. 4. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1977.
- LOURTEIG, A. Flora del Uruguay III - Mayacaceae, Zygophyllaceae, celastraceae, Lythraceae y Primulaceae. Montevideo: Museo Nacional de Historia Natural, 1963.
- NOVARA, L. J. Flora del Valle de Lerma. Aportes Botanicos de Salta. Ser. Flora. Herbario MCNS, Salta, v. 2, n.10, ago. 1993.
- PIO CORREA, M. Dicionário de plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas. Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura e Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, 1984. v. 6, 77 p.
- SCHULTZ, A.R.H. Introdução à botânica sistemática. 4. ed. Porto Alegre: UFRGS, 1984. 414p. il.
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- Revista Brasileira de Farmacognosia (2009): Revisão da M. ilicifolia - Contribuição ao estudo das propriedades farmacológicas - Acesso em 17 de janeiro de 2016
- CPQBA UNICAMP (2002): Agrotecnologia para o cultivo da espinheira-santa - Acesso em 17 de janeiro de 2016
- The Plant List: Maytenus ilicifolia - Acesso em 17 de janeiro de 2016
GOOGLE IMAGES de Maytenus ilicifolia - Acesso em 17 de janeiro de 2016